terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Prova do Negócio Jurídico

O que se busca com a lide é dirimir conflitos de interesses. As partes levam a juízo suas pretensões buscando demonstrar que seu direito frente ao do outro deve prevalecer. O juízo deve resolver a contenda. Para isto, analisa os fatos e atos apresentados a si, e, partindo destes, intenta descobrir a verdade legal.

Deste modo, a cada parte interessada cabe ressaltar seu interesse e demonstrar seu direito. No entanto, como versa Venosa “a utilidade de um direito mede-se pela possibilidade de que se dispõe para se realizar a prova de um fato”. No mesmo sentido, “a demonstração da evidência em juízo é a finalidade elementar do processo na busca da verdade processual”. Destarte, conclui-se que de nada adianta ter um direito, buscá-lo em juízo, se não se tem meios para prová-lo. Assim, a prova de um direito é “o meio de que o interessado se vale para demonstrar legalmente a existência de um negócio jurídico”. Clássica é a definição de Clóvis Beviláqua, para o qual prova “é o conjunto dos meios empregados para demonstrar, legalmente, a existência de um ato jurídico”.

Por vezes a lei determina que, para ter validade o negócio jurídico, deve este seguir determinada forma. São os atos formais ou solenes. Não observado preceito legal, o negócio não tem validade, pois lhe falta requisito essencial. Destarte, a prova destes negócios far-se-á pela própria forma preestabelecida. Ainda, existem os atos não formais. Nestes, a prova faz-se através dos meios admitidos em direito. Ademais, os fatos notórios e os incontroversos não precisam ser provados, além dos fatos negativos, quando não expressem uma afirmativa.

Os Meios de Prova ou Provas em Espécie

A prova, como visto, é a forma de o interessado garantir-se em juízo; literalmente por ela este prova a verdade de suas alegações. Por ser matéria de trato tanto material quanto processual, é trabalhada em ambos os ramos, de modo que o Direito Civil estipula os meios pelos quais se comprovarão os fatos, atos e negócios jurídicos, e o Direito Processual traça os limites da produção da prova, sua apreciação pelo juiz, e a técnica de produzi-la em juízo.

O art. 212 do Código Civil de 2002 enumera, de forma não taxativa, os meios de prova, quais sejam:

Art. 212. Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídico pode ser provado mediante:

I - confissão;

II - documento;

III - testemunha;

IV - presunção;

V - perícia.

Neste ponto salienta-se o disposto no art. 332 do CPC:

Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

Assim, desde que sua forma não seja pré-exigida ou ilegal, os mais variados meios de prova são aceitos no ordenamento.

A Confissão

Art. 212, 213, 214 do CC; Art. 348 a 354 CPC

Considerada a rainha das provas, é ato de indivíduo capaz, que reconhece e declara verdadeiro o fato o qual lhe é imputado ou contra ele é alegado, desde que não verse sobre direitos indisponíveis; “um pronunciamento contra o próprio manifestante da vontade”. Somente a parte é sujeito de confissão, no entanto lhe é facultado realizá-la através de representante.

A confissão pode ser:

Judicial – ocorre durante o curso do processo e em seu bojo. É o momento oportuno para colhê-la, perante o juiz.

Extrajudicial – reconhecimento do fato litigioso fora do processo;

Expressa – emana da deliberação do confitente por forma oral ou escrita;

Tácita – admitida por presunção. Decorre de criação jurídica em decorrência do silêncio do agente. Tem como exemplo maior a revelia.

A confissão é indivisível e irrevogável, podendo ser anulada por erro de fato ou coação, no mesmo processo ou em novo, dependendo de oportunidade e conveniência. Quanto ao dolo, não é causa de anulação de confissão, podendo gerar, em princípio, indenização à vítima.

Documentos

Art. 215 a 226 do CC.

Os documentos em geral são escritos que, não surgindo como prova pré-constituída, apresentam elementos de prova. Sua forma não precisa, necessariamente, ser a escrita, podendo abranger qualquer representação material destinada a reproduzir duradouramente um pensamento, como cópias fotográficas, desde que autenticada ou não impugnada sua validade. Por vezes admite-se escritos em língua estrangeira; nestes casos, devem ser traduzidos por tradutor juramentado. No tocante às certidões extraídas de qualquer ato do processo, estas terão o mesmo valor probatório dos originais, assim também os traslados e as certidões extraídas por oficial público, de instrumento ou documento lançados em suas notas. O telegrama pode ser probatório; quando tenha sua autenticidade contestada, esta deve ser dirimida através de conferência com o original. A regra vale também para o correio eletrônico. Acrescente-se que a prova não supre a ausência do título de crédito ou original, nos casos em que puderem ser estes exibidos.

Por fim, os documentos dividem-se em:

Públicos – emanam de autoridade pública no exercício de sua função. Provam materialmente os negócios que exigem tal forma. Se a lei não requer registro, são oponíveis contra terceiros; quando transcritos perante oficial juramentado, tem fé pública.

Particular – são os feitos mediante atividade privada. Vale para prova dos negócios jurídicos de qualquer valor quando a lei não exigir instrumento público ou as partes não convencionarem em contrário. Para valer com relação a terceiros é necessário que o instrumento esteja inscrito no Registro Público. Como não é da substância de negócio jurídico algum, sua prova pode ser suprida por outra admissível. No tocante aos livros e fichas empresariais, estas provam contra as pessoas que pertencem em seu favor, desde que não eivadas de vícios extrínsecos ou intrínsecos.

Testemunha

Art. 227 a 229 do CC; 400 a 419 do CPC

Prova testemunhal, conforme Venosa, “é aquela que resulta do depoimento oral das pessoas que viram, ouviram ou souberam dos fatos relacionados com a causa”. É a afirmação em juízo de fatos relevantes a causa por pessoa estranha a lide. Por ser forma de prova que apresenta grande carga subjetiva, o legislador preveniu, no art. 401 do CPC, que “a prova exclusivamente testemunhal só se admite nos contratos cujo valor não exceda o décuplo do maior salário mínimo vigente no país, ao tempo em que foram celebrados”. No entanto, esta é sempre admissível como suplementar ou subsidiária da prova por escrito, independente de valores. As provas podem ser judiciárias, quando estranhos à relação declaram fatos relevantes para a causa; e instrumentárias, quando se manifestam sobre o conteúdo do instrumento que subscrevem.

A lei veda a determinadas pessoas ser testemunhas. Trata-se de proibição por incapacidade, falta de legitimidade, por interessadas no litígio, parentesco ou ser cônjuge. O art. 405 do CPC distingue os incapazes, os impedidos e os suspeitos de ser testemunhas.

Art. 405.

...

§ 1o São incapazes:

I - o interdito por demência;

II - o que, acometido por enfermidade, ou debilidade mental, ao tempo em que ocorreram os fatos, não podia discerni-los; ou, ao tempo em que deve depor, não está habilitado a transmitir as percepções;

III - o menor de 16 (dezesseis) anos;

IV - o cego e o surdo, quando a ciência do fato depender dos sentidos que Ihes faltam.

§ 2o São impedidos:

I - o cônjuge, bem como o ascendente e o descendente em qualquer grau, ou colateral, até o terceiro grau, de alguma das partes, por consangüinidade ou afinidade, salvo se o exigir o interesse público, ou, tratando-se de causa relativa ao estado da pessoa, não se puder obter de outro modo a prova, que o juiz repute necessária ao julgamento do mérito; II - o que é parte na causa;

III - o que intervém em nome de uma parte, como o tutor na causa do menor, o representante legal da pessoa jurídica, o juiz, o advogado e outros, que assistam ou tenham assistido as partes

§ 3o São suspeitos:

I - o condenado por crime de falso testemunho, havendo transitado em julgado a sentença; II - o que, por seus costumes, não for digno de fé; III - o inimigo capital da parte, ou o seu amigo íntimo; IV - o que tiver interesse no litígio§ 4o Sendo estritamente necessário, o juiz ouvirá testemunhas impedidas ou suspeitas; mas os seus depoimentos serão prestados independentemente de compromisso (art. 415) e o juiz Ihes atribuirá o valor que possam merecer

...

O § 4º de referido artigo acrescenta:

Sendo estritamente necessário, o juiz ouvirá testemunhas impedidas ou suspeitas; mas os seus depoimentos serão prestados independentemente de compromisso (art. 415) e o juiz Ihes atribuirá o valor que possam merecer

Destarte, o § único do art. 228 do CC versa que “para a prova de fatos que só elas (testemunhas vedadas legalmente) conheçam, pode o juiz admitir o depoimento das pessoas a que se refere este artigo”. Ainda, conforme o CPC, os vedados por parentesco podem, excepcionalmente, testemunhar em ações de estado, tais como investigação de paternidade.

Regra geral a testemunha não pode negar-se a depor. O art. 406 do CPC traz exceções.

Art. 406. A testemunha não é obrigada a depor de fatos:

I - que Ihe acarretem grave dano, bem como ao seu cônjuge e aos seus parentes consangüíneos ou afins, em linha reta, ou na colateral em segundo grau;

II - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo.

No mesmo sentido o art. 229 do CC.

Art. 229. Ninguém pode ser obrigado a depor sobre fato:

I - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo;

II - a que não possa responder sem desonra própria, de seu cônjuge, parente em grau sucessível, ou amigo íntimo;

III - que o exponha, ou às pessoas referidas no inciso antecedente, a perigo de vida, de demanda, ou de dano patrimonial imediato.

Por fim, o CPC veda que o sujeito da relação jurídica seja testemunha. No entanto, pode ser ouvido no processo, seja por iniciativa da parte contrária, seja pela do juiz.

Presunções e Indícios

Art. 230 do CC;

Presunção

Venosa define Presunção como “a conclusão que se extrai de fato conhecido para provar-se a existência de outro desconhecido” . Classificam-se em legais e comuns.

As legais tem o condão de eliminar dificuldade no deslinde de questão de prova. Sempre acatadas pelo magistrado, subdividem-se em:

Presunção iuris et de iuri – é aquela que não admite prova em contrário; é a própria lei aceita-a como absoluta, sem admitir que se prove o contrário.

Presunção iuris tantum - também conhecida por condicional, admite prova em contrário. Exemplo claro desta está no art. 8º do CC, a comoriência.

As presunções comuns, também conhecidas como hominis, decorrem do que habitualmente acontece na realidade que nos cerca. Fundam-se naquilo que ordinariamente acontece, e se impõe pela conseqüência do raciocínio lógico. Esse raciocínio colabora para formar a convicção do juiz. Esta forma de presunção pode ser aceita pelo juízo dentro dos limites em que se admite a prova testemunhal, e desde que não contrariada pelo restante das provas produzidas no processo. Na prática, as presunções relativas formam a regra, enquanto as absolutas são a exceção. Estas geralmente aparecem ao tratar-se de matéria de ordem pública ou interesse coletivo.

Indícios

Quanto aos indícios, são o ponto de partida para se chegar, por inferência, na presunção. Circunstâncias que possuem relação com o fato delituoso, possibilitando a construção de hipóteses com ele relacionadas sobre a autoria e seus demais aspectos. Destarte, indício é a causa ou o meio para chegar-se a presunção, que é o fim.

Perícia

Como ao juiz faltam conhecimento técnicos sobre determinadas matérias, faz-se necessário para a solução da lide que o magistrado busque laudo técnico; em vista disto, se valerá de um “perito”. A prova pericial pode referir-se aos mais diversos campos da ciência, visto que o campo do exame pericial é vasto como o próprio conhecimento humano. Os arts. 420 a 439 do CPC versam sobre a prova pericial, sendo que os arts. 145 a 147 tratam da responsabilidade do perito. Ainda, o art. 342 do CP cuida da falsa perícia.

Observe-se que o juiz não fica adstrito a conclusão do perito, podendo, sempre que julgar necessário, pedir nova perícia. Por vezes, o próprio magistrado pode verificar o local, o objeto ou a pessoa e tirar suas próprias conclusões: trata-se da inspeção judicial. No entanto, esta é simples visão ocular, enquanto aquele é exame técnico. Assim, fica sujeito ao magistrado sopesar o valor que dará para ambas.

A perícia pode ser feita extrajudicialmente; no entanto, ao magistrado cabe valorar esta conforme o que por bem entender. Tendo a finalidade de fixar fatos que com o tempo podem modificar-se ou perder-se, denomina-se vistoria ad-perpetuam rei memoriam; serve de prova para o futuro pois fixa uma situação.

Por fim, são dignos de realce os arts. 231 e 232 do CC. Estes dispositivos versam sobre a recusa em submeter-se a exame médico, e como, regra geral, opera-se presunção indigitada contra o recusante.

Tempos atrás era o fio do bigode que garantia o negócio entre dois homens. Hodiernamente o cenário mudou. Observa-se crescente tendência nas pessoas buscarem maiores garantias contra a má-fé. Um reflexo das pressões populares; cansados de sofrer com fraudadores, estelionatários, os cidadãos protegem-se atrás de garantias consagradas nas normas vigentes.

Desta forma, a prova é um instrumento que o homem probo possui para garantir seus direitos. Ela demonstra à sociedade que determinado indivíduo é detentor do poder sobre aquilo que conquistou dentro de forma legal. Em conta disto, pode buscar em juízo a defesa de seus interesses quando violados. Destarte, observa-se a tamanha importância daquela; e conclui-se que sua existência é indispensável ao funcionamento do sistema jurídico vigente.

Bibliografia:

Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil - Vol. I Parte Geral. 8ª Edição. Ed. Atlas. 2008


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